domingo, 17 de abril de 2011

RELÍQUIA - O VÉU DE VERÔNICA - PESQUISAS ICONOGRÁFICAS E HISTÓRICAS





Uma imagem única



















As características do véu e da imagem que nele aparece são únicas.

O véu, de 17, 5 por 24 centímetros (mas originariamente maior, como nos diz a Relatione, embora não saibamos quanto), é um trabalho de tecelagem finíssimo (ainda que sejam perceptíveis algumas imperfeições na trama), empregando fios de cerca de um milímetro e espaço entre um e outro de cerca de dois milímetros; parece ter cor dourado-escura, dependendo da perspectiva de visão e da iluminação, e é transparente.

Em razão da cor e da transparência, há uma hipótese de que o tecido seja fabricado com bisso marinho, filamentos trabalhados de um molusco denominado Pinna nobilis.

O bisso marinho é um tecido finíssimo, de brilho semelhante ao da seda, à qual se assemelha também pela sensação táctil, de uma leveza quase impalpável.

A hipótese sobre o tecido foi feita em 2004 por Chiara Vigo, uma das últimas tecelãs a usar esse material, mas ainda espera por uma confirmação definitiva, que poderá ser obtida, se não por exame direto (que não é possível hoje, em razão da disposição do véu entre dois vidros), pelo menos por pesquisas morfológicas e estruturais a serem realizadas com instrumentação específica.

No véu está impresso um rosto de fronte alta, com cabelos compridos que chegam até os ombros, bigodes ralos e barba bipartida.

 Os olhos têm uma posição particular: estão ligeiramente voltados para o alto, mostrando o branco do globo ocular sob a pupila.

O rosto não fica visível quando o véu é observado em transparência, mas apenas quando disposto sobre um fundo opaco; o que é singular é que a imagem aparece especularmente e com a mesma intensidade de cor tanto na frente quanto no verso.

 O véu aparentemente se comporta como uma película fotográfica positiva.

O rosto é claramente assimétrico, com um lado mais inchado; há manchas evidentes, que poderiam ser interpretadas como sangue, em particular perto da boca e do nariz, que parece tumefato.

As manchas são bidimensionais e não seguem o relevo do rosto.







A – o rosto do Sudário de Turim;

B – sobreposição do rosto do véu de Manoppello ao rosto do Sudário de Turim;

C – o rosto do véu de Manoppello

(por Blandina Paschalis Schlömer)








Pesquisas iconográficas e históricas

A tradição popular venerou o Santo Rosto de Manoppello por mais de quatrocentos anos, como uma relíquia, atribuindo-lhe o caráter de acheiropoietos (termo grego que significa “não feito pela mão humana”).

Mas apenas nos últimos anos do século passado começaram a ser feitas pesquisas sobre esse objeto.

Os resultados dessas pesquisas, relacionadas à história e à própria natureza da imagem do Santo Rosto, são até agora certamente muito parciais, mas também surpreendentes.

Nos estudos de irmã Blandina Paschalis Schlömer, pintora e estudiosa dos ícones, a pesquisadora defende uma relação muito estreita entre a imagem do Véu de Manoppello e o rosto impresso no Sudário de Turim (esta última imagem foi determinada pela oxidação das fibras de linho mais superficiais de que o lençol é composto; como todos sabem, as pesquisas científicas realizadas nos últimos cem anos não conseguiram ainda determinar a causa dessa oxidação).

 A relação seria tão estreita a ponto de permitir uma compatibilidade total, com uma série de pontos de contato, quando é feita a sobreposição do Santo Rosto com a face impressa no Sudário (para completar, há ainda plena compatibilidade desses dois objetos com as manchas de sangue que aparecem no Sudário de Oviedo).

Ao mesmo tempo, existem duas diferenças fundamentais entre as duas imagens: em primeiro lugar, a imagem do Sudário de Turim apresenta os olhos fechados e um rosto de aparência mais rígida e ossuda, enquanto o Santo Rosto tem os olhos abertos e aparência mais relaxada; em segundo lugar, nem todas as feridas que aparecem no Sudário de Turim estão também no Santo Rosto, e as que aparecem têm dimensões geométricas menores e são um tanto mais esmaecidas.

A primeira consequência da observação dessa correspondência entre as duas imagens foi a reconsideração da história da transmissão iconográfica do rosto de Cristo, no Oriente e no Ocidente; além disso, permitiu identificar o percurso do Santo Rosto nos séculos anteriores a sua inesperada e misteriosa chegada a Manoppello.

 Em 31 de maio de 1999, o professor Heinrich Pfeiffer, jesuíta, um dos maiores especialistas em arte cristã (leciona História da Arte na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma), depois de anos de testes, comunicou o resultado de suas pesquisas na sede da Associação de Imprensa Estrangeira, em Roma; em resumo, dizia ter sido encontrada a verônica romana, a famosa imagem do rosto de Cristo acheiropoietos conhecida em Roma entre os séculos XII e XVII, época em que, conservada na Basílica Vaticana, era exposta periodicamente à veneração dos fiéis.

Uma tradição antiga atribuía essa imagem ao episódio da mulher que teria enxugado com um lenço o rosto de Jesus durante a subida para o Calvário – essa mulher se chamaria Verônica, nome que podemos interpretar como a provável corrupção dos termos vera icona, “verdadeira imagem”.



“O Santo Rosto é a Verônica romana”




Padre Pfeiffer já escreveu nestas páginas sobre as razões da identificação do Santo Rosto com essa relíquia que, em certa época, foi mais famosa que o próprio Sudário de Turim (H. Pfeiffer, “Mas a ‘Verônica’ está em Manoppello”, in: 30Dias, nº 5, maio de 2000, pp. 78-79).

Nesse artigo, afirmava, com argumentos mais que convincentes, que a Verônica – que nos é descrita por fontes medievais como um tecido finíssimo transparente, com uma imagem visível de ambos os lados – foi levada de Roma numa data imprecisa, no início do século XVII (outra hipótese, formulada por Saverio Gaeta com base em documentos de arquivo e considerações históricas, dataria esse episódio para um tempo mais antigo, o do Saque de Roma de 1527, o que, de qualquer forma, não muda substancialmente a questão).

A Verônica teria reaparecido em Manoppello entre 1608 e 1618, de acordo com a documentação histórica local, depurada dos aspectos de lenda.

Apresentaremos um pequeno resumo de alguns dos dados fundamentais apresentados por Pfeiffer para justificar essa identificação.

Em primeiro lugar, a Verônica que ainda se encontra em São Pedro, no Vaticano, já não mostra nenhuma imagem: os poucos estudiosos do passado que puderam observá-la de perto, como De Waal e Wilpert (lembremos que a tela presente em Roma não é exposta ao público desde o século XVII), viram nela apenas algumas manchas escuras; mesmo quem teve a oportunidade de observá-la recentemente (inclusive o pontífice João Paulo II) não encontrou nela vestígios de imagem.

Em segundo lugar, o tecido atualmente em Roma não é transparente de modo algum, enquanto o relicário de 1350 que continha a Verônica em Roma, ainda conservado no tesouro da Basílica Vaticana, é constituído por dois vidros de cristal de rocha e se destinava, evidentemente, a conter um objeto que pudesse ser exposto de ambos os lados.

Esse relicário, de formato quadrado e dimensões compatíveis com o véu de Manoppello, do qual é pouco maior (e já vimos que o véu foi aparado), foi substituído mais tarde, primeiro pelo relicário usado em meados do século XVI (hoje perdido), depois pelo atual: um documento relata a solenidade da transposição da relíquia – ou melhor, como é nossa hipótese, da transposição do objeto falsificado que a substituiu –, ocorrida na data de 21 de março de 1606, para um nicho aberto na pilastra da cúpula precisamente chamada “da Verônica”.

Como lemos num relato de Giacomo Grimaldi, então arquivista de São Pedro, datado de 1618, os vidros do relicário de 1350 estão quebrados: e um resíduo, considerado como vidro, pode ser notado ainda hoje pregado à borda inferior do véu de Manoppello.

De modo semelhante ao que já dissemos a propósito das investigações sobre a natureza física do tecido com o qual é fabricado o véu, a impossibilidade atual de removê-lo do ostensório que o contém não permitiu ainda que os pesquisadores chegassem a uma certeza a respeito da identidade de materiais entre o desse fragmento de vidro e o que resta do relicário vaticano de 1350.

Em terceiro lugar, a Verônica de Roma apresentava um rosto com os olhos abertos, como vemos em todas as suas representações anteriores a 1616, enquanto a cópia feita naquele ano possui um rosto com os olhos fechados.

Paulo V, pouco depois, vetaria qualquer outra cópia da relíquia, sob pena de excomunhão; Urbano VIII, em 1628, ordenou que todas as cópias existentes, feitas nos últimos anos, fossem destruídas.



O rosto de uma pessoa real
























Mas padre Pfeiffer vai mais além com suas pesquisas, que nos permitem considerar extremamente provável que o Santo Rosto de Manoppello, ou seja, a Verônica romana, é um dos dois protótipos, ou modelos fundamentais, da imagem de Cristo.

O segundo modelo é o Sudário de Turim.

Padre Pfeiffer destaca particularmente que as maçãs do rosto das imagens clássicas de Cristo são quase sempre desiguais, como ocorre no Sudário de Turim e no Santo Rosto: a face, portanto, é assimétrica, contrariamente ao que vemos em todas as representações das divindades antigas, que apresentam um rosto ideal e simétrico.

O Cristo clássico tem, portanto, um rosto pessoal e individual; e o modelo desse rosto, dada a sua estrutura fortemente assimétrica, é o Sudário de Turim, ou o Sudário de Turim somado ao Santo Rosto (provavelmente as duas relíquias devem ter circulado unidas por um certo período, como imagina Pfeiffer); no que diz respeito aos olhos e a todos os aspectos mais vitais, o único modelo é o Santo Rosto.













O SUDÁRIO E O VÉU DE MANOPELLO








Logo, concluímos, trata-se de um rosto que de fato existiu, concreto, real; não de um modelo abstrato, tomado de empréstimo da iconografia de algum filósofo, como muitas vezes lemos ou ouvimos de historiadores da arte, cristianistas e até teólogos.


 O rosto de um homem de carne, não de uma ideia.

A pesquisa iconográfica leva ainda padre Pfeiffer a defender, no que é seguido por muitos outros especialistas, a identificação do Sudário de Turim com o Mandylion de Edessa, que era conhecido nessa cidade em 544, época do assédio dos persas, e seria transladado para Constantinopla em 944, onde desapareceria em 1204 para, mais tarde, ser encontrado no Ocidente.


Da mesma forma, padre Pfeiffer propõe a identificação do Santo Rosto de Manoppello com a imagem do rosto de Cristo que se transferiu de Kamulia (Capadócia) para Constantinopla em 574, e aí desapareceu por volta de 705, durante o segundo reinado do imperador Justiniano II; esse tecido finíssimo, transparente, ao chegar a Roma, foi escondido (talvez pregado sobre o chamado ícone acheropsita do Sancta Sanctorum da Basílica de Latrão), recuperado no papado de Inocêncio III (1198-1216) e levado a São Pedro, com o nome de Verônica.






























Padre Pfeiffer está firmemente convencido de que o Santo Rosto seja uma imagem acheiropoietos:

“Tomando como ponto de partida a perfeita superposição do rosto do Sudário de Turim com o rosto de Manoppello, somos induzidos a admitir que a imagem no véu e a que vemos no Sudário tenham-se formado ao mesmo tempo.

Ou seja, nos três dias que decorrem entre o sepultamento de Jesus e sua ressurreição, dentro do sepulcro. O Sudário de Manoppello e o de Turim são as duas únicas verdadeiras imagens do rosto de Cristo ditas acheropsitas, ou seja, não realizadas por mãos humanas” (H. Pfeiffer, in: P. Baglioni, “Bernini ou não, é uma obra-prima”, in: 30Dias, nº 9, setembro de 2004, pp. 56-65).





Existe algum indício físico que nos possa levar a considerar que, tal como a imagem do Santo Sudário não foi produzida artificialmente, o mesmo tenha-se dado com a imagem do Santo Rosto de Manoppello?







VEJA NA PRÓXIMA POSTAGEM



















































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